terça-feira, 28 de agosto de 2012

Desvele-me


A vocação de uma cidade passa diretamente pelos discursos de seus cidadãos, mas até que ponto estes são representativos e válidos?  E como determinar estes valores? Toda fala é feita de uma perspectiva que envolve no mínimo o espaço e o tempo do sujeito que a pronuncia. Não se trata de meros vetores que se cruzam, tanto um como outro são condições fundantes das complexas proposições que ali se colocam. No entanto percebe-se que certas vozes ganham legitimidade no cotidiano de sua escuta. Escutar e apreender são ações que participam o ouvinte da narrativa. Neste sentido, penso que as narrativas estão diretamente relacionadas à dialogia, porquanto requerem ao menos dois seres presentes envolvidos em seu tecido. Em termos bakhtiniano o diálogo não se esgota e implica responsividade. Se aplicarmos estes elementos ao contexto onde a narrativa se desenvolve, certamente cairemos na protagonização de seus atores e por conseguinte na apropriação de seus espaços (circunvisão) e de seus tempos.
Os mecanismos de apropriação dos espaços considerados bens públicos estão à mão quando a presença do ser se manifesta. Suas falas revisitam e atualizam ambientes e nesta polifonia descobrem respostas às questões. Ao participar do discurso da cidade como ouvinte e como alguém que também produz um discurso pode-se desvelar a cidade e assim descobrir a sua vocação e também a sua participação singular dentro do contexto de mundo.
Hoje alguns prédios de Piracaia foram tombados. Participei efetivamente deste discurso. Isto muito significou para mim, não só como cidadã de Piracaia, mas como cidadã do mundo que sou. Não se trata apenas de um casarão construído no início do século passado. Não são meras paredes. São Paredes que contam histórias, participaram da política, da economia e da cultura de uma época. Hoje eles nos falam, nos contam, se impõem e exigem uma postura endossada em três ações que dialogam: Recuperar, Preservar e Difundir. Parabéns Piracaia por sua conquista.

sábado, 25 de agosto de 2012

Piracaia tem histórias

Quem bom que tinha e que tem...

A Cidade se perfaz assim, sua narrativa é alimentada e atualizada no presente. Ter hoje, meios que facilitam a dinamização, a veiculação de imagens é um potencial que está sendo descoberto rapidamente.
Esta semana foi criado o grupo "Piracaia tem histórias" por Roberto Banfi, um filho de Piracaia residindo em Bragança. Eu o conheci por meio do Tazula, artista plástico e blogueiro de 82 anos. Roberto possui centenas de fotografias digitalizadas de Piracaia e anda postando tudo no face, onde todos comentam e trazem da memória suas histórias. Hoje conheci pessoalmente o Roberto. Ando observando a intensificação da comunicação nesta rede social, claro que a questão das eleições está a frente, mas ao meu ver o interesse pela cidade aumenta dia a dia. Em menos de duas semanas foram criados dois grupos e um perfil no facebook que versam sobre as questões da cidade, a saber: Jovens pergutam; Piracaia tem histórias e Rio Cachoeira... Eu estou nestes grupos e nos seguintes: Mulheres de Gaia, MOMA, Meio Ambiente de Piracaia e, Amigos do Projeto Campo dos Sonhos. Amanhã procurarei saber dos blogs desta cidade.

São Gonçalo

São Gonçalo...

Segundo Tânia, festeira de São Gonçalo e também congadeira, a história de São Gonçalo se deu pelo fato dele não conseguir evangelizar conforme os costumes, então tomou de sua viola e passou a "cantar o evangelho" e assim a evangelização acontecia facilmente e em meio as festas. Porém um festeiro hoje me contou que São Gonçalo era um rapaz que resolveu apartar uma briga entre dois outros rapazes e disse que era muito melhor dançar, cantar, bater palmas e os pés do que brigar... e assim sempre que havia uma briga, apartavam os encrenqueiros dessa maneira. São Gonçalo se tornou santo e faz muitos milagres, principalmente os relacionados à saúde das pernas... Após a concessão da graça o devoto oferece uma festa a este Santo como prova de se reconhecimento. A festa envolve o famoso "fogadão" comida feita de carne de vaca, arroz, batata e feijão, feitos em larga escala, uma vez que a festa é aberta e participa quem bem desejar. Os altares são compostos no dia anterior e, geralmente, é composto pelas imagens, além da de São Gonçalo, Nossa Senhora, Santo Antônio e São Benedito. Participar desta festa hoje me colocou em contato com um universo diferente para mim, muito vivo e rico me leva a questão da narrativa religiosa engendrada e, na maioria da vezes, fundante de esquemas sociais imperativos na demanda cotidiana. Para além do calendário de festas religiosas estão estas festas que o rompem, colocando na "ordem do dia" um chamamento, reivindicando a atenção de uma comunidade para o atendimento de pedido, uma graça recebida, um milagre. Um dos altares hoje era também do violeiro "Lourencinho" que estava internado e lhe faltava o ar, clamando como ele mesmo disse, primeiro a Deus, questionou se a Nossa Senhora iria esquecer dele e São Gonçalo... pediu com muita fé e quando abriu os olhos estava bem: um milagre.
Muitos com o Santo na mão dançavam e proclamavam seus milagres... Por outro lado a festa envolve dinâmicas, logísticas, uma administração dos alimentos. A Tânia me contou que já teve festa de ter cerca de 7000 pessoas e dos donativos recebidos alimentou-se todas estas pessoas e ainda sobrou tantos que se formaram cestas básicas que foram doadas... Como explicar esta narrativa dentro do tecido que é a cidade? São fios fortes transgeracionais, a fé é perpassada no canto, não há a letra escrita de seus versos, mas todos cantam conhecem, há uma história oral cantada propagada no pé, nas mãos e no paladar...  

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Homo à Cura

"Certa vez, atravessando um rio, Cura viu um pedaço de terra argilosa: cogitando, tomou um pedaço e começou a dar-lhe forma. Enquanto refletia sobre o que criara, interveio Júpiter. A Cura pediu-lhe que desse espírito à forma de argila, o que fez ele de bom grado. Como a Cura quis então dar seu nome ao que tinha dado forma, Júpiter a proibiu e exigiu que fosse dado o nome. Enquanto Cura e Júpiter disputavam sobre o nome, surgiu também a terra (tellus) querendo dar o seu nome, uma vez que havia fornecido um pedaço de seu corpo. Os disputantes tomaram Saturno como árbitro. Saturno pronunciou a seguinte decisão, aparentemente equitativa: 'Tu, Júpiter, por teres dado o espírito, deves receber na morte o espírito e tu, Terra, por teres dado o corpo, deves receber o corpo. Como, porém, foi a Cura quem primeiro o formou, ele deve pertencer a Cura enquanto viver. Como, no entanto, sobre o nome há disputa, ele deve chamar-se Homo, pois foi feito de húmus." (Ser e Tempo, p. 266 HEIDEGGER)


ORGANICIDADE

Quais são os limites da cidade... certamente não respeitam os perímetros urbanos... Em qualquer cidade suas fronteiras são diluídas por diferentes ações que vêm da comunicação, das tecnologias, mas principalmente pelas possibilidades de interações reais e virtuais... Fui a uma festa -  HUMANIFESTO em Joanópolis encontrei amigos de Atibaia, Piracaia e Bragança. Amigos que se conversam e interagem em redes como o Facebook. Questões advindas de olhares atentos são ali suscitadas e o diálogo é provocado. De festa à promoção de encontros buscando o desenvolvimento e melhorias do lugar onde se vive. A questão é: Até que ponto estão realmente engajados, militantes e protoganizadores de seus espaços. Muitos, a grande maioria fica em: "O que a Prefeitura está fazendo?" "O que a Cidade faz por mim?" e na diáletica propositiva - não se questiona "O que estou fazendo pela cidade?" Ora, se tantos se desconhecem enquanto cidadãos, não sabem de suas vocações, como podem evocar a vocação da cidade?
Em Piracaia qual seria o lugar de exercer a Cidadania. Mas será que ela, ou melhor, esse exercício necessita mesmo de um espaço específico para si.

Também por meio deste já havíamos combinado uma reunião/movimento pelas praças de Piracaia, por conta da derrubada de árvores condenadas que vem acontecendo. Pessoas se mobilizam em torno de grupos ambientais. Em Piracaia há no quesito ambiental o GEPAP e o MOMA - além do Conselho Municipal de Meio Ambiente - COMDEMA; em termos culturais: o Conselho de Cultura; Mulheres de Gaia... Iniciativas pontuais e eventuais geralmente como tentativas de resistências fazem frente a demandas ambientais. O discurso administrativo é: há 15 ou 20 anos estas árvores estão condenadas (nesse tempo nada se fez por elas, a não ser podas incorretas). Há anos a Cidade não respeita seu rio Cachoeira, agora canalizará parte dele. O patrimônio arquitetônico em processo de tombamento vem sofrendo alterações significativas. As principais praças são replanejadas a bel prazer das administrações. Há também um Plano Diretor que o cidadãos desconhecem e também desconhecem as reformulações que este está sofrendo, sendo uma delas, talvez a mais importante que é a questão da expansão urbana. Está já foi fechada e não cabe mais modificações. Interessante observar que o grupo que participou desta reformulação é o grupo de interesse imobiliário.

A Cidade pulsa, mas ao que parece a cidadania é uma questão de privilégios e não de direito. Como seria uma educação para a cidadania? quem sabe uma educação orgânica - no sentido biológico do termo...
O R G A N I C I D A D E